Outras explicações para a queda dos investimentos

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por Daniel Moreli Rocha*

Segundo dados divulgados pelo IBGE, com base no Sistema de Contas Nacionais, o PIB brasileiro acumulou um crescimento de 1,5% entre o terceiro trimestre de 2011 e o último trimestre de 2012. Pela ótica da demanda, um dos principais responsáveis pelo baixo crescimento da economia foi a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), que nesse período apresentou uma queda de 5,1%. Como se sabe, flutuações nos gastos com investimento tem não somente relação direta com ciclos de negócios no curto prazo, mas também influência determinante no crescimento de longo prazo e na produtividade da economia.

Quedas nesse componente da demanda interna não são raras. Nos últimos 15 anos, houve redução nos investimentos em quatro períodos: 1998/1999, 2002/2003, 2008/2009 e, mais recentemente, 2011/2012. Enquanto os três primeiros biênios estão amplamente relacionados às últimas três crises financeiras que o país enfrentou, explicar o último período utilizando exclusivamente efeitos delongados da crise de 2008, ainda que grave, parece prematuro. É preciso também considerar os desafios enfrentados pelas empresas brasileiras principalmente no ambiente de negócios local. No caso do Brasil, onde as taxas internas de poupança são muito baixas, é interessante acompanhar mais de perto o que se passa com a saúde financeira das empresas que são grandes fontes geradoras de lucro e, consequentemente, determinantes nas decisões de investimento do país.

Para melhor dimensionar, foi analisado o balanço de 167 empresas listadas em Bolsa, resgatando os valores de receita e lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (LAJIDA, ou do termo em inglês, EBITDA). Essas denominações contidas nas demonstrações do resultado são importantes para oferecer uma visão do crescimento do negócio e também da eficiência operacional. Essas companhias foram divididas em 16 setores e englobam um valor de mercado de cerca de R$ 500 bilhões no fechamento de 2012.

No mesmo período em que o PIB cresceu 1,5% e os investimentos caíram 5,1%, essas empresas apresentaram um crescimento da receita consolidada de 17% enquanto que o EBITDA caiu 18%. Com esses números, pode-se então chegar a importantes conclusões.

Em primeiro lugar, como não houve queda da receita não se configura um período em que as empresas sofreram impacto de desacelerações econômicas, como ocorreu logo após a crise de 2008 em setores ligados ao crescimento mundial como petróleo e gás, mineração e siderurgia.

Em segundo lugar, a queda do lucro consolidado reflete melhor o ambiente de negócios (o EBITDA consolidado das empresas desacelerou de R$ 230,5 bilhões no 3º trimestre de 2011 para R$ 188,8 bilhões no 4º trimestre de 2012). Vale destacar que, dos 16 setores pesquisados, metade apresentou queda no EBITDA nesse tipo de comparação, com destaque para o setor de construção civil.

Outro ponto importante é que essa alta de receita associada à queda de lucro que implica em redução de margem das empresas (dos 16 setores pesquisados, 10 apresentaram margem/EBITDA menores no 4º trimestre de 2012 em relação ao 3º trimestre de 2011) pode estar relacionada, em muitos casos, com o aumento de custos e também de despesas operacionais não financeiras. É interessante traçar um paralelo com o cenário macroeconômico, pois essa alta de custos pode ser identificada também pelos índices de inflação. Uma medida do aumento de preços calculada pelo Índice de Preços por Atacado (IPA-M, que pertence ao Índice Geral de Preços da Fundação Getúlio Vargas) apresentou uma alta de 9,4% nesse período. Além disso, é preciso considerar também que as empresas têm enfrentado reajustes salariais mais intensos nos últimos dois anos (como base de comparação, o salário mínimo aumentou 22% entre 2010 e 2012). Considerações que também não contemplam estudos recentes, feitos pelo Banco Central, nos quais a produtividade da indústria não tem crescido na mesma proporção que os salários. Nesse sentido, percebe-se um importante movimento por parte do governo preocupado em reduzir a matriz de custos das empresas brasileiras. Uma das medidas recentemente anunciadas refere-se à antecipação da renovação de contratos de geração de energia elétrica, produzindo queda nas tarifas, que deverá trazer benefícios principalmente para o setor industrial. Para encerrar esse ponto de reflexão, vale relembrar as dificuldades que as empresas dependentes da infraestrutura brasileira têm enfrentado, como a situação de rodovias, ferrovias e de estrutura de tecnologia e telecomunicações que acabam implicando custos adicionais e encarecimento das despesas operacionais.

A quarta e última conclusão está relacionada à capacidade de repasse desses aumentos de custos aos preços finais. Setores mais diretamente ligados à demanda final de bens semi e não duráveis, com demanda mais inelástica de seus produtos em relação aos preços, conseguem estabelecer o repasse de uma forma mais direta e proporcional ao aumento de custos. Ou seja, mesmo que seus custos estejam enfrentando os mesmos aumentos que os demais setores, o repasse de preços garante aumento da receita de vendas, relativa estabilidade e até crescimento dos lucros, produzindo assim menor impacto direto nas variações do EBITDA. Como exemplo é possível verificar o que ocorre nos setores de alimentos e comércio e, de uma forma menos evidente, educação e telecomunicações.

Em resumo, uma menor lucratividade das empresas brasileiras acaba impactando diretamente sua capacidade de investir e expandir produção. Ainda que gastos com investimentos das empresas não representem todo investimento da economia, já temos aqui uma fonte importante da determinação do ciclo de negócios. Mesmo que as empresas listadas em Bolsa não reflitam necessariamente a composição do PIB brasileiro, os dados levantados tornam-se úteis para acrescentar argumentos à discussão da redução recente dos investimentos no país além de fomentar possíveis desdobramentos desta análise. No próximo ciclo trimestral de balanços poderemos ter mais clareza sobre o ambiente de negócios no Brasil, o desempenho futuro de investimentos e, por conseguinte, o crescimento do PIB.

Ainda assim, mesmo que esse ambiente continue de forma temporária, uma alternativa à fonte de recursos para os investimentos continua sendo o mercado de capitais. Em um cenário de baixas taxas de juros no mundo, a captação de recursos via emissão de títulos corporativos continua sendo uma excelente opção para as empresas brasileiras enfrentarem este cenário adverso.

*Daniel Moreli Rocha é Superintendente de Tesouraria do BI&P – Banco Indusval & Partners